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  • Foto do escritorNélia Duarte

Segundo consta Leo Stein, que comprou a Matisse 'Mulher com chapéu' (1905), terá definido a pintura como: 'a mais horrível mancha de tinta jamais vista'.

A figura retratada, esposa de Matisse, ostenta camadas de tinta espessas que, segundo li, terá sido a técnica que lhe foi ensinada por Gauguin, numa composição cromática de cores puras sem relação directa com o tom do motivo, característica do fauvismo, e também cores frias que favorecem a tristeza e um certo alheamento na expressão da mulher. Quando foi exibido pela primeira vez foi mal recebido pelos críticos que consideraram a pintura incompreensível e ridícula. Pouco ou nada há para inventar no retrato - e na pintura em geral. Quem hoje pinta já bebeu de muitas fontes, faz umas recriações, estabelece uns diálogos com a obra de antecessores e pouco mais. Com ou sem escola. Foi a pensar nisto que fiz uma longa pausa de pinturas e do óleo que é o meio que mais me satisfaz. Fui esvaziando necessidades com alguns desenhos e um ou outro graffiti. Quando comecei a pintar interessou-me desde logo o retrato que é uma forma de inventar personagens e dar-lhes vida como se pode fazer na literatura. Tenho alguma propensão para observar e perceber (sem julgamento condenatório) comportamentos. Nada virada para a natureza morta ou para o deleite da outra, viva mas puramente natural, é nas cidades, nos lugares habitados e preenchidos de emoções que eu encontro substância para as minhas construções. Procurei sempre em volta e dentro de mim, como não podia deixar de ser dada a minha natureza genuína e orgulhosamente exigente, mas não deixei de observar a arte de pintores (essencialmente do sec. XX) como: Matisse, Picasso, Van Dongen, Modigliani, Dix, Kirchner, Klimt, porque foi observando e experimentando que aprendi o que sei. Foi pelo retrato que voltei aos pincéis, numa muito ligeira exalação dos fauves.





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  • Foto do escritorNélia Duarte

Aquele olhar de perfídia entre a fresta e a cortina que me faz lembrar Beemote ou Behemoth, só que em branco, e me desperta o desejo de ler de novo "Margarita e o Mestre" do Bulgakov. Há desenhos que não consigo ignorar, ou adiar explorar, e demoro-me neles; não sacudo a folha para a pilha de outras, apressadamente, enquanto já outra impoluta puxo a mim para novo começo. Começos sabe-se lá do quê, nem sempre sai ao primeiro traço, ou a muitos traços, cores, riscos… demoro-me, porque percebo logo que o gosto; goste-o nos olhos e nos bigodes finos, esticados, impercetivelmente a rasgar na pasta de pastel.


O meu Behenoth branco, a efectivar a frase de Fausto do Goethe que, de resto, dá o mote e alguma substância a Bulgakov

"-...mas, quem é você, afinal? - Sou a parte da força que quer sempre o mal, mas sempre faz o bem"


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  • Foto do escritorNélia Duarte

sou pela urgência, pela impulsividade, pelo que não pode ser contido ou demorado ou burilado, sou pelo descontrolo das mãos, sou muito mais da paixão, sanguínea, excessiva, do que sou pelo desvelo amoroso demorado que transforma com suavidade a palidez do papel em simetrias e perfeição de linhas. sou pelo que não é planeado. Sou pelo que acontece e se interpreta e percebe depois de acontecer. Sou, por isso mesmo, capaz de não sentir medo. sou isto tudo nos processos criativos.

Mas sou igualmente isto, aquilo e aqueloutro... Percebi recentemente que o graffiti é uma expressão artística que chega às pessoas, que transforma momentos quotidianos de vida num alargado número de pessoas. É uma exposição vivida. É meu desejo continuar em parede, em amplitude. A explorar novos processos, que me permitam ser como me apresentei neste texto. Qualquer desenho meu pode vir a ver parede, só preciso de uma trincha e tinta preta. "A cidade não é um lugar. É a moldura de uma vida. A moldura à procura de retrato (...)" - Mia Couto






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